Vitamina C - #bad11


A vitamina C esteve, nos últimos anos, na boca de todo mundo (no sentido literal e figurado). Suas possíveis propriedades de aumentar a imunidade do corpo contra agente infecciosos e de combater os famigerados radicais livres os colocam na mídia de tempos em tempos. Hoje é fácil encontrar alimentos ricos em vitamina C. Sabemos que várias frutas e legumes possuem certas quantidades de ácido ascórbico[1] e que, graças a descoberta de como produzi-la em escala industrial[2], produtos alimentícios que nem sonhariam em ter vitamina C, como leites, cereais, biscoitos e outros, além de suplementos vitamínicos (quem já tomou um tablete laranja efervescente num copo de água sabe do que estou falando).

Entretanto, essa aparente fartura de vitamina C no mundo nem sempre foi assim. Houve uma época em que pessoas morriam sem saber o porquê. Sintomas como hemorragias na boca, feridas que não fechavam, dentes soltos na gengiva, inchaços e dores nas articulações. O escorbuto ceifou a vida de milhões de pessoas desde sua descrição na Antiguidade, por Hipócrates. O escurbuto causava problemas de ordem financeira já que grande parte da tripulação de navios que cruzavam o mundo atrás de especiarias e na conquista de novas terras eram acometidos por esse terrível mau[3]. Entretanto, ninguém sabia exatamente como tratar essa doença. Existiam sim, plantas medicinais e técnicas que eram conhecidas até pelos povos ameríndios para tratar dessa doença. Entretanto, isso só era possível na terra firme.

Foi então que, nos idos de 1747, um cirurgião escocês mudou, de certa forma, o mundo. James Lind fez o primeiro ensaio clínico da Europa ao tratar doentes acometidos pelo escorbuto com frutas cítricos como o limão e a laranja. Lind fez seus experimentos a bordo do HMS Salisbury com doze tripulantes com escorbuto. Ele os separou em grupos e cada um recebeu, além de uma mesa dieta, um tratamento específico[5]. Um desses grupos ele tratou com duas laranjas e um limão. Esse foi o único grupo que teve melhoras significativas. Anos depois, Lind pubicou sua descoberta, relacionando o tratamento do escorbuto com os ácidos presentes em laranjas e limões. Lind não sabia que a falta de vitamina C causava a doença e nem que administrando essa vitamina os doentes melhoram. O importante no trabalho de Lind foi que graças a ele, anos mais tarde, o Royal Navy adotou o consumo de laranjas e limões por parte da tripulação.

James Cook, um dos maiores navegadores da história da Inglaterra conseguiu circunavegar o globo sem perder um único marinheiro para a doença. A alimentação da tripulação consistia em ervas e de chucrute. Embora tenham pouco ácido ascórbico, a alimentação associada a uma rigorosa limpeza do navio e da cozinha onde eram preparados os alimentos permitiu que nenhum homem desenvolvesse escorbuto de forma severa.

A vitamina C é importante para o organismo já que ela é importante na construção das fibras de colágeno. Essas fibras são encontradas nos tendões dos músculos, constitui vasos sanguíneos e mantém os dentes firmes na gengiva. Por incrível que pareça, no mundo moderno, principalmente nos países mais ricos, casos de escorbuto entre adultos começam a crescer. Isso se deve, principalmente, a falta de alimentos ricos em vitamina C que, nesses casos é substituída por alimentos industrializados pobres dessa importante vitamina. Não há remédios para a cura do escurbuto. O único meio de prevenir e tratá-la é consumindo alimentos saudáveis e que contenham vitamina C em sua composição.

Quando for tomar aquele suco de laranja, lembre-se dos milhões que, infelizmente, se despediram da vida mais cedo por simples falta de informação. Saboreie o suco sabendo que sua saúde agradece. =D

Esse post faz parte da mobilização do Blog Action Day (BAD) e, em 2011, resolvemos falar sobre comida. Você pode participar escrevendo algo relacionado a comida em seu blog, Facebook, Twitter (use #bad11 para participar) e outras redes sociais. Acesse o site do grupo, aqui.



Informações extras:
[1]: alguns alimentos são notáveis em terem vitamina C, como limão ou laranja, mas alimentos como brócolis, mamão, pimentão e outros também possuem quantidades significantes de vitamina C. Mas, de alimento de relativamente fácil acesso, a acerola ganha disparado. Um copo de suco de acerola pode conter quatro vezes a necessidade diária dessa vitamina.

[2]: a produção industrial do ácido ascórbico é feita a partir da hidrólise (quebra) da glicose. O rendimento do processo é considerado alto, já que cerca de 90% da glicose é transformada em vitamina C.

[3]: acredita-se que cerca de um milhão de marinheiros tenham morrido devido à doença. A viagens de navio duravam vários dias e a tripulação não tinha acesso a comida de qualidade. Na esmagadora maioria, os marinheiros tinham como alimentação um pouco de água e bolachas que disputavam com os ratos. Carnes e algumas frutas apodreciam logo na primeira semana, o que tornava difícil manter a saúde da tripulação. A maioria das viagens consistia em levar para a Europa especiarias que muitas pessoas estariam dispostas a pagar caro por elas (o que tornava a viagem lucrativa). Entre essas especiarias estava o cravo-da-índia, muito usado para perfumar os alimentos, disfarçando do cheiro podre que amanava de carnes, por exemplo. O cravo-da-índia possui vitamina C. Por séculos os marinheiros morriam de uma doença em que a cura estava justamente guardado dentro dos compartimentos dos navios onde estavam[4]. Seria engraçado, se não fosse triste.

[4]: possivelmente os marinheiros teriam que procurar outra fonte de vitamina C do que o cravo-da-índia. Ela era uma das especiarias mais caras no começo da Idade Moderna. Cada um quilo custavam até sete gramas de ouro.

[5]: James Lind acreditava que, devido o doente entrar em estado de putrefação, ácidos poderiam melhorar a situação. Entre os tratamentos que Lind empregou em seus doentes estava a administração de vinagre; ácido sulfúrico e de cidra. Além de apenas água do mar.

Com imagem por ~nerdyhachi em seu deviantART.

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