9 Meses - post 12

Ana não vê a hora de contar pessoalmente aos pais que está grávida. Durante a arrumação das
malas, por que não explicar um pouquinho de embriologia para o marido.

Primeiros movimentos...
Ana estava arrumando as últimas peças em uma mala antes de dormirem. Sábado, logo após Carlos sair do trabalho, eles partiriam para Sorocaba, onde moravam os pais de Ana. Desde o ano passado que Ana não os vê e estava ansiosa em contar pessoalmente o fato de estar grávida de seu primeiro filho.

-- Carlos, quando você acabar suas coisas na empresa, não fique enrolando, hein! Venha logo para casa para estarmos na casa de mamãe antes das duas da tarde...

-- Fique tranquila, amor. Meio-dia estarei aqui... - e terminando de ler as últimas linhas de um importante documento da empresa, perguntou - querida, como está o nosso filho?

Ana sente um leve friozinho na barriga. Mesmo sabendo que estava grávida, ainda não se acostumara com a ideia de que teria um filho. Após curtir esse momento em seu íntimo, ela diz:

-- Está tudo bem amor... eu ainda não o sinto, já que ele é muitíssimo pequeno, menor que uma ervilha. Mas, ele já está realizando seus primeiros movimentos.

-- Sério? Que movimentos? - perguntou o marido, se inclinando da cadeira em direção a Ana, curioso em saber.

-- Bom, você lembra que o embriãozinho ele está se desenvolvendo e criando uma variedade de tecidos, certo?

-- Você diz não-sei-o-que-derma e o tubo nervoso?

-- Há! Há! Há! Isso mesmo... o ectoderma, que é a camada mais externa, o mesoderma, que seria o recheio do embrião, e o endoderma, que o reveste internamente. Sim, o tubo neural, a notocorda, e outras estruturas relacionadas estão se desenvolvendo também. Acontece que tudo isso está acontecendo de modo que o embrião se aparente com um disco, ou uma panqueca...

-- Ah não, não coloque comida em suas explicações. Você lembra o que fez com minha lasanha[1]?

-- Ok, tudo bem... não coloco seus pratos favoritos na conversa de novo... mas então, o embrião não passa de uma pan... - respira fundo - de um disco recheado - disse Ana, movimentando as mãos no ar, deixando-a aberta, simulando um disco. Pois bem, o tubo neural começa a passar por uma imensa multiplicação celular, o que faz ele ficar cada vez maior. Esse crescimento se dá principalmente na extensão céfalo-caudal do embrião, ou seja, o crescimento celular é maior na extensão do crânio até o fim do tronco. Esse crescimento faz com que o embrião comece a se dobrar, ficando com aquela conhecida forma que vemos por aí, a chamada posição fetal.

Desenho esquemático do desenvolvimento embrionário. Em 'A', o embrião com quatro semanas e sendo
visualizado com o âmnion removido. Os esquemas 'B', 'C' e 'D' são cortes medianos (céfalo-caudal)
do esquema 'A'. Podemos ver o crescimento do tubo nervoso, que dobra o embrião em direção ao
saco vitelino. Parte desse saco acaba ficando fora do corpo do embrião.

-- Hum, que interessante... logicamente, como tudo na Biologia, esse movimento do embrião recebe um nome?

-- Sim, recebe... é chamado de flexura cefálica. É quando a porção cefálica do sistema nervoso se dobra consideravelmente. Enquanto isso vai acontecendo, os lados do embrião se fundem no plano mediano do corpo - disse Ana, apontando para o centro de seu corpo, de baixo para cima - Grande parte de nossa simetria se deve a isso. Observe a disposição dos pelos em seu corpo, eles parecem se encontrar no centro de abdomen, por exemplo.

Carlos levanta a camisa e observa alguns poucos pelos que ele exibia no corpo. Ana continua:

-- Bom, e o que acontece quando o embrião se dobra em direção ao saco vitelino que estava logo abaixo dele? - o marido fica olhando um pouco para Ana, em um misto de estar pensando sobre o assunto e esperando uma resposta - O que acontece é que parte fica dentro do embrião e parte fica para fora. A parte que fica para fora e fará parte do cordão umbilical irá aos poucos se degenerando já que a sua função de servir como reserva nutritiva não faz muito sentido, visto que ele recebe tudo que precisa diretamente da mãe.

-- E a parte que fica dentro do embrião? - questiona Carlos.

-- Ele irá formar o futuro intestino do futuro embrião.

-- É sério? Que legal!

-- Bom, ele irá formar umas outras estruturas interessantes também, mas posso tratar disso mais para frente.  Pois então, esse intestino é dividido em três porções nesse momento: o intestino anterior, que fica na primeira parte do corpo do embrião, na região da boca e faringe, o intestino médio, que fica no meio do corpo do embrião e se liga com a porção do saco vitelino que está no lado de fora, e o intestino posterior, que fica na porção final do embrião.

-- Nossa... quantos movimentos!

-- Ainda você não viu nada... tem coisas que estão acontecendo ou vão acontecer que são mais impressionantes.

-- Então conte, né!

-- Outro dia eu conto... eu preciso prender a audiência de meu único aluno - disse, piscando o olho para Carlos.

-- Ah... bom, se eu quiser saber, eu posso simplesmente pegar seu livro de embriologia e ler...

-- Vá em frente - disse, apontando para o pesado e volumoso livro de graduação. Carlos olha o livro repousando sobre a mesa, olha para Ana com um estampado olhar desafiador para ele, retorna a olhar para o livro e diz:

-- Acho que está um pouco tarde. É melhor a gente ir dormir...

Ana solta uma sonora risada.

Informações extras:
[1]: para saber essa história, clique aqui.

Com imagem por ~aimeelikestotakepics em seu deviantART. Desenho esquemático feito por mim, protegido por CC.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Calendário Cósmico 07

A mágica do diagnóstico - post 2

Répteis não existem...